Que o brasileiro é preconceituoso isso todo mundo sabe. É uma das verdades que tentamos esconder (ou não), mas que toda hora vem à tona. Mas como todo bom brasileiro, temos a certeza absoluta de que a virada de ano remedirá todos os nossos pecados, falhas e defeitos. Eles ficarão em um passado “remoto”, encarcerados no longínquo Ano Velho… Mas vem 2018 com suas tenebrosas armadilhas e artimanhas e nos mostra que o pecado do julgamento e do preconceito veio incrustado em nós como uma tatuagem feita em momento de impulso. Daquelas que muitas vezes nem percebemos que está em nós, mas quando notamos que a carregamos sentimos repulsa e arrependimento. E além de tudo temos consciência que para nos livrarmos dela passaremos por um processo doloroso e que deixará marcas.
Mas o que houve já nos primeiros momentos de 2018 que pode trazer essa sensação para nós?
Aconteceu uma foto. De um menino, de bermuda molhada, sem camisa, segurando as mãos perto da cintura, de olhos arregalados e boquiaberto assistindo aos fogos de Copacabana, dentro da água. Ao fundo a massa de pessoas de branco de costas se confraternizando na areia. É importante frisar que o menino é negro e se soube que tem nove anos.
Essa imagem foi registrada pelo fotógrafo Lucas Landau da Agência Reuters. Foi postada em uma de suas redes sociais e ganhou a internet com dezenas de legendas e interpretações das mais variadas, todas que falam da sensação de quem olham para a imagem, do receptor. Nenhuma delas é a voz do menino ou do fotografo.
Falou-se de pobreza, abandono, racismo, críticas a ausência parental, a política de esquerda/direita, do fetiche da corporeidade negra, invisibilidade social, e tantas outras coisas que não cabem no sentimento do menino. Tudo foi fala dos “julgadores das redes sociais”. Pessoas de todas as matizes externando através de seus próprio olhar o seu preconceito e sua interpretação. A foto era apenas veículo, apenas um motivo, uma desculpa…
O mesmo perfil de pessoa que em 2017 resolveu pré-julgar e criar uma conceituação do que é/não era Arte e deve/não deveria estar exposto ao público em um Museu, agora em plena Virada de Ano resolveu Pré – Julgar e Pré-conceituar o Deslumbramento de uma Criança ante um dos mais belos eventos que o Homem produz. A que ponto chegamos?
Será que nem o olhar repleto de sonhos da infância tem o direito de ser simplesmente o que é? Um lugar para a imaginação, para a magia.
Será que todos os locais possíveis terão que ser tocados por essa coleção de preconceitos, ataques e violências que nós utilizamos no mundo adulto para ocupar espaços com maior espaço e prestígio?
Eu escolho o lugar das coisas simples em primeiro lugar, onde um menino feliz pode ser só um menino feliz na praia, vendo os fogos… Pra ter história pra contar quando crescer… E for um rapaz feliz que pode se confraternizar na areia, sob outros fogos, com quem ele amar.
Se Ano Novo é sinônimo de Esperança, eu espero que haja muito ano novo, todos os 365 dias para que esse preconceito se dissipe!
Que venha muito Réveillon!
Paulo Rogério Candido
Sociólogo, Servidor Público Municipal