Relato pessoal – Professora trans denuncia transfobia em escola de Guarapari
“Meu nome é Alice Rena, sou professora da rede municipal de ensino de Guarapari e mulher trans. Estou vivendo uma situação de violência e abandono institucional que preciso tornar pública.
Nos últimos meses, fui vítima de três situações graves de transfobia dentro da escola onde trabalho*, a EMEF Cândida Soares Machado. Em ambas, os agressores foram estudantes, durante o horário de aula, na frente da turma. No primeiro episódio, fui chamada de ‘bicha’. No segundo, de ‘traveco’ e no terceiro de “prostituta”. As situações foram extremamente constrangedoras, agressivas e dolorosas.
Procurei a direção da escola, formalizei as denúncias, protocolei cartas, tentei resolver pelo diálogo. Em uma das reuniões com a equipe pedagógica, foi acordado que o aluno pediria desculpas publicamente – o que nunca aconteceu. A direção não cobrou o cumprimento do acordo, não me acolheu e ainda se recusou a assinar o recebimento da carta de repúdio. Quando retornei com uma nova carta-resposta, o diretor novamente se recusou a receber e mandou que eu enviasse por e-mail, como se fosse apenas um problema administrativo.
Fiz três manifestações formais na Ouvidoria da Prefeitura de Guarapari e enviei três e-mails ao gabinete da Secretaria Municipal de Educação. Nunca obtive resposta direta. Tudo o que recebi da Secretaria foi uma resposta padronizada que minimiza a gravidade dos fatos, alegando que exigir desculpas seria uma punição repetida. Mas o que eu pedi não foi punição. Foi respeito. Foi reparação simbólica.
Diante do descaso e da repetição das ofensas, recorri ao Ministério Público do Espírito Santo (MPES). E agora, felizmente, o caso foi acolhido e transformado na Notícia de Fato nº 2025.0012.4921-67* atualmente em apuração. Uma comissão de direitos da diversidade também levou o caso ao MP, o que fortaleceu a investigação.
Não estou expondo essa situação por vaidade ou por vingança. Estou fazendo isso porque sou educadora, sou trans, e tenho direito de trabalhar com dignidade. Meu silêncio só fortaleceria a impunidade. Eu quero que outras pessoas trans, que educadoras e educadores LGBTQIA+ vejam que não estão sozinhos.
O que está em jogo aqui não é só minha dor. É o papel da escola pública em garantir um ambiente de respeito, acolhimento e proteção a todas as identidade. O que aconteceu comigo não pode continuar sendo tratado como algo pequeno. E se o silêncio da escola protege o preconceito, minha voz vai seguir dizendo: isso é transfobia, e não pode ser normalizado.”
— Professora Alice Rena