O Brasil é a cara da CBF, que é a cara da Seleção, que é a cara da política brasileira, que é a cara do povo brasileiro, que é a cara do Brasil…
E onde o meu canarinho belga entra nessa história?
Não era necessário explicar, mas somos tão desmemoriados que alguns ainda devem se surpreender com a nossa roda civilizatória.
Em tempos pretéritos, quando o Brasil não se parecia tanto com a CBF – que ainda era CBD -, a Seleção Brasileira era chamada carinhosamente de ”Seleção Canarinho”, e estes não tinham salários milionários, cabelos pintados, carros luxuosos e tatuagens extravagantes.
Eram grandes craques e jogavam bola com prazer e nos deram cinco Copas do Mundo!
E, com Pelé e Garrincha em campo, nunca perdemos uma partida de futebol. Um feito memorável!
Além disso, a política era menos fisiológica e o povo tinha a ”alma venturosa”, embora ainda fôssemos o ”país do futuro”!
Vivíamos muito distante da modernidade tecnológica e, também, dos atos pecaminosos desses estranhos tempos modernos de hoje.
Ocorre que o mundo não é mais o mesmo e o Brasil seguiu o ritmo de algumas dessas mudanças!
Conta-se que a poderosa FIFA também mudou, ou ”foi mudada”! Não se sabe ao certo!
O certo é que a FIFA teve que cortar na carne as suas mazelas, banir alguns de seus dirigentes corruptos, mandar prender outros e se refez como entidade máxima da maior paixão universal.
Mas o Brasil fez o inverso, mesmo com alguns cidadãos tentando fazer o que seria necessário!
A CBF está com o seu ex-presidente em prisão domiciliar nos EUA e com outros ex-dirigentes afastados, acusados de improbidade. Roubo mesmo!
Mas os seus tentáculos continuam, digamos, ”ditando as normas da casa”.
Conta-se que há uma estranha nuvem de possibilidades duvidosas sobre algumas decisões administrativas e, sobretudo, esportivas!
Quando perdemos, surpreendentemente, de 7×1 e 3×0, ou seja, 10×1, na Copa do Mundo em pleno território nacional, protagonizamos o maior vexame da História do Futebol.
Mas não aprendemos a lição! Ou não descobrimos as verdadeiras razões dessas derrotas!
Culpamos os deuses dos gramados e, principalmente, livramos a CBF da responsabilidade maior.
As ameaças de CPI’s no Congresso Nacional e da reformulação nas estruturas administrativas do futebol brasileiro ficaram no ar. E muitos executivos e funcionários graduados da CBF continuam nos seus respectivos cargos! Um acinte!
E encontramos um abnegado e estudioso treinador que estragou tudo: classificou a ”Seleção Canarinho” para a Copa do Mundo da Rússia.
Revigorada e em seus múltiplos disfarces, a CBF lavou os seus panos de bunda com a mesma água que serve a seus executivos, parceiros e anunciantes, e em abjeta cumplicidade!
E a política – sempre a nossa política -, achou a solução ideal para, digamos, ”contemplar a interesseiros e interessados”.
E o povo, o sonhador e desmemoriado povo brasileiro, passou uma borracha nas vicissitudes das derrotas vergonhosas dentro e fora dos gramados!
Primeiro, vimos a ”Seleção Canarinho” se classificar nas eliminatórias e vencer alguns amistosos antes da competição mundial.
E, na Copa da Rússia, revigorou os nossos sonhos a cada jogo, na medida em que empatamos e vencemos três partidas. E vestimos as camisas amarelas, nos reunimos nos bares e lares e pintamos as nossas calçadas!
E achamos que a ”Seleção Canarinho” estava pronta para nos redimir da CBF, da política partidária e dos problemas que tanto nos afligem. Ledo engano!
E fomos enfrentar a Bélgica!
Ora, como temer a quem não tem ao menos um dos nossos títulos, nenhum dos nossos heróis e muito menos as nossas glórias?
Mas os deuses do futebol, possivelmente tentando nos alertar mais uma vez, fizeram justiça com os próprios pés:
– Não podem ganhar com absolvição sem julgamento!
E esses deuses, creio, nos deram como consolo sociológico outros canarinhos a cantar diante de nossos sonhos desfeitos do hexacampeonato mundial, e tão valentes quanto os nossos e alguns com algumas plumagens negras, assim como os nossos, e a solfejar em nossos ouvidos uma merecida vitória.
E não perdemos para outros símbolos alheios aos nossos sentimentos de brasilidade. Isso não!
Perdemos para outros canarinhos, o que não nos provoca nenhuma indignação!
Só não entendemos a apatia de nossos jogadores em campo e os vários gols perdidos!
Assim, perdemos para os canarinhos belgas, tão comuns aos olhos, ouvidos e lares do Brasil!
Esse Brasil que tem a cara da CBF, que tem a cara da Seleção, que tem a cara da política, que tem a cara do Brasil, que tem a cara da CBF… que não sabe reverenciar os nossos craques do passado.
A Confederação Brasileira de Futebol jamais homenageou dignamente o ”rei” Pelé, muito menos a Garrincha, Vavá, Bellini, Barbosa, Djalma Santos, Fontana, Leônidas, Domingos da Guia, Nilton Santos, dentre outros heróis canarinhos amarelinhos do passado.
E, especialmente contra Pelé, a CBF nutre uma implicância pessoal e tenta desconhecer a sua importância para a História do Futebol Mundial.
E, no momento em que escrevo esse texto – após uma nova derrota dolorida da Seleção Brasileira – ouço, na varanda de minha casa, em uma laboriosa gaiola, o meu canarinho belga cantando maviosamente.
E um canto que jamais havia ouvido, de uma felicidade incontida!
Parece uma orquestra emitindo diversos sons, e está assim desde o primeiro tempo do jogo com a Bélgica, e em plena alegria!
Agora, acabo de tomar uma merecida decisão: vou soltá-lo, ele não merece prisão!
Quem merece cadeia é esse pessoal da CBF!
Abro a porta da gaiola e o meu canarinho belga voa. E foi um voo lindo!
Voa, meu canarinho! Vá cantar em liberdade a sua bela vitória!
A vitória dos merecedores!
Maciel de Aguiar
Escritor cinquentenário e insubordinado das barrancas do Cricaré.
O conteúdo do texto é exclusivo e de responsabilidade do autor.
07/07/2018
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